sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Para Sempre Minha: Capítulo 3 — Guerra declarada

Oi pessoal! Desculpe a demora. Como eu já havia avisado em minha página no Face, tive que viajar com urgência por motivos familiares, e fiquei sem internet. Por isso, não postei nada antes. Mas, agora está tudo certo. Esse capítulo não tem nada de sexual, até porque nós já tivemos dois capítulos assim. Hoje, vamos saber como foi o dia de Gideon após ele e Eva combinarem de se encontrar as escondidas. E teremos dois gatos participando: Brett e Arnoldo. Deu para sentir a pressão, né? Então chega de enrolação e bora partir para o que interessa! Boa leitura!

“Prefiro ser louco e lutar pelo nosso amor, do que viver a sana de perdê-lo”.
— Roni Roque da Silva

Estou impaciente e ansioso para esta noite. Mal posso esperar para ter Eva em meus braços novamente. Me programei para ir embora mais cedo do trabalho para preparar tudo o que tinha planejado para esta noite. Eva quer que tenhamos um encontro romântico e é o que teremos, embora eu não seja muito bom nesse seguimento, afinal nunca passei por isso até esse momento. Nosso começo foi marcado pelo sexo. Foram raros os momentos em que pudemos sair e aproveitar a companhia um do outro. Hoje faremos tudo conforme manda o figurino.
No caminho para o trabalho, enviei uma mensagem para Arnoldo pedindo para que me ligue assim que possível. Como todo bom encontro, teremos um jantar, que jamais poderia ser preparado por mim já que, segundo meu melhor amigo “eu não conseguiria fritar um ovo nem para salvar minha própria vida”.
Passei as primeiras horas do expediente com a mente focada em Eva. Eu só sabia me lembrar dos momentos tórridos de paixão que compartilhamos ontem à noite e hoje de manhã. Claro, tivemos uma conversa franca e um tanto desconfortável sobre como as coisas funcionarão até que possamos tornar nosso relacionamento público novamente.
Mesmo com todos os problemas que enfrentaremos me sinto confiante de que tudo vai se resolver. E esse sentimento só aumentou quando, assim que entrei em meu escritório, recebi a ligação da própria Carolina Herrera me avisando que o vestido de Eva está quase pronto. Ela queria que eu confirmasse as medidas, apenas no caso de terem mudado, o que de fato não aconteceu. Marcamos o dia para que eu fosse até seu ateliê ver o resultado de sua criação, num horário menos corrido. A última coisa que quero é chamar atenção indesejada. Eu paguei uma pequena fortuna por esse pedido e quero sigilo absoluto.
Cinco minutos após a conversa com a estilista, recebi outro telefonema, dessa vez de Robert Philips, empresário da banda Six-Ninths, para confirmar a reunião que teríamos às duas da tarde, para discutir os detalhes do lançamento do videoclipe de ‘Golden’. Normalmente, eu não me envolvo nesses trâmites diretamente. Deixo tudo com meu padrasto, que está nesse mercado a mais tempo.Eele apenas me repassa as decisões tomadas. No entanto, me vi obrigado a participar desse projeto pessoalmente, já que ele envolve muito mais do que a publicidade da banda recém-contratada pela gravadora.
Golden’ não é apenas um single de estreia, mas uma canção escrita para minha namorada pelo seu ex. Brett Kline não é apenas vocalista da banda. Ele é o único homem que tem potencial suficiente para tirar Eva de mim. Não que eu vá deixar isso acontecer. Não. Eu faço o que preciso for para mantê-la ao meu lado. Custe o que custar.
Ainda assim, ele é um problema.
Fecho os olhos e ponho minha cabeça entre as mãos, tentando respirar fundo e me acalmar. Cada estrofe daquela música dança em minha mente numa tortura ininterrupta, me fazendo reviver o dia do show.
A forma crua e apaixonada como Kline cantava, o beijo que ele deu em Eva, a forma como ela o correspondeu... Tudo vem à minha numa avalanche que atinge cruelmente a minha confiança de outrora. Mesmo que Eva negue que sente algo por Brett, a atração entre ambos é forte, tanto que até eu pude senti-la, apenas de ver a forma íntima e autoconsciente como seus corpos se moviam durante o beijo. Aquilo me causou uma dor impossível de se descrever. Impossível até de se imaginar.
Sei que ela fez isso para se vingar de mim por não ter levado seus sentimentos em conta quando Corinne voltou a se aproximar. Eu queria mantê-la como minha amiga, e achava que Eva estava exagerando. Mas, após sentir na pele o que ela sentiu quando via a mim e a minha ex-noiva juntos... Entendi que fui um completo imbecil.
No meio da minha sessão de insegurança, uma coisa me vem à minha cabeça. O evento já está acertado, faltando apenas a confirmação da data e alguns outros detalhes. Brett deve estar exultante, obviamente. Sua euforia só não deve ser maior do que a que sentiu ao saber que Eva e eu não estamos mais namorando, ao menos não publicamente. E, é óbvio que, se aproveitando disso, ele irá convidá-la para acompanhá-lo, especialmente porque ela é a musa inspiradora de ‘Golden’. E, abusado como é, ele já deve ter ligado para fazer o convite a Eva.
Imediatamente acesso o telefone do ramal de Eva e escuto a gravação da última ligação. Tenho certeza de que ele ainda não tem o número do celular dela.
Quem atende é Megumi, uma das secretárias.
Bom dia”, disse Kline com sua voz rouca e educada. “Seria possível falar com a senhorita Eva Tramell, por favor?”
Quem gostaria?” ela perguntou nitidamente afetada, mesmo tentando parecer profissional.
Brett Kline”.
Bom, no momento ela não... oh, espere, só um minuto, ela acaba de chegar. Vou colocá-lo na linha de espera”.
Certo. Muito obrigado, Megumi”, ele disse, com certeza com um sorriso idiota na cara.
Não há de quê”.
Minutos depois a voz do meu anjo, em seu tom profissional soa do outro lado.
Escritório de Mark Garrity, Eva Tramell falando”. Isso me consola um pouco, já que ficou claro que ela não aprovou o fato de ele ter ligado para seu trabalho.
Eva. Encontrei você. É o Brett”, disse todo animado.
Olá”, ela o cumprimentou educadamente. “Como vai a turnê?
É uma coisa surreal. A ficha ainda não caiu”.
É algo que você sempre quis, e que realmente merece. Aproveita”, ela desejou com sinceridade. É nítido que ela tem um enorme carinho por ele.
Valeu”, ele fez uma pausa e continuou. “Escuta só. Sei que você está trabalhando, por isso não vou tomar muito do seu tempo. Estou voltando pra Nova York, e quero ver você”.
Instintivamente meu corpo enrijece.
Acho que não é uma boa ideia”, ela parecia tensa.
“O clipe de ‘Golden’ vai ser exibido em primeira mão na Times Square”,  ele continuou. “Quero você lá comigo”.
Lá com... Uau”.
Minhas mãos tremem ao escutar isso. Ela se sentiu tentada a aceitar o convite.
Fico muito honrada com o convite, mas preciso saber... tudo bem se a gente for só amigos?” Ela queria garantir que não havia segundas intenções naquele convite, embora isso fosse impossível.
De jeito nenhum”, ele soltou uma risada.  “Você está solteira agora, loirinha. A derrota de Cross é a minha vitória”.
Seguro o telefone com força agora, quase o partindo em dois, e minha outra mão se fecha em punho com tanta força, que eu mal sinto o sangue circulando em meus dedos. Meus dentes se apertam e posso ouvir o trincar da minha mandíbula.
Filho. Da. Puta.
Uma fúria possessiva animal me toma. Muito maior e mais forte do que no dia que vi os dois se beijando. E, misturado ao medo de perder Eva, esse sentimento fica cada vez mais difícil de conter.
Não é bem assim”, ela tentou contornar. “Eu ainda não estou pronta pra outro relacionamento, Brett”.
Eu estou pedindo pra você me acompanhar em um evento, não pra casar comigo”, insistiu.
Brett é sério...”.
Você precisa ir, Eva”, ele a cortou. Seu timbre de voz assumiu um tom grave, cheio de emoção e sedução. “É a sua música. Você não pode me negar isso”.
Mas eu tenho que negar”, ela se esquivou. Aquilo acalma um pouco minha fúria, pois ela estava tentando me preservar.
Vou ficar muito chateado se você não for”, ele disse baixinho, se mostrando vulnerável. “Sem brincadeira. Podemos ir como amigos, se o problema é esse, mas você precisa estar lá comigo”.
 “Não quero dar falsas esperanças pra você”.
Seria um favor que você faria pra um amigo”, cara de pau da porra!
Eva se manteve em silêncio, talvez pensando o mesmo que eu (mas não com agressividade, como eu).
 “Tudo bem?”, ele perguntou, não desistindo, sempre pressionado.
 “Tudo bem”, ela concordou, cansada.
Beleza”, o triunfo escorria de sua voz. “Vai ser na quinta ou na sexta à noite, ainda não sei. Me passa o seu celular que eu mando uma mensagem pra confirmar”.
 “Anotou? Preciso desligar”, ela falou após recitar apressadamente o número que sei de cor.
Um bom dia de trabalho pra você”, ele desejou suavemente.
Valeu Brett... Eu estou muito feliz por você. Tchau”, ela retribuiu no mesmo tom.
Meus músculos doem enquanto solto a respiração. Estou tão tenso como uma tábua de madeira. Meus dedos soltam o telefone aos poucos, deixando-o cair ruidosamente no tampo da mesa. Uma ardência começa a atormentar minha garganta e sinto meu café da manhã querendo fazer o caminho de volta, mas respiro fundo mais algumas vezes, ignorando a dor, e consigo parar o enjoo.
Fecho os olhos e tombo a cabeça para trás, tentando me acalmar. Mas minha mente trabalha a mil. A atração entre eles é absurdamente intensa. Apenas pela voz de Eva, pude perceber o quanto Brett ainda mexe com seus sentidos, mesmo que ela tente se afastar. Ele é insistente, e vai fazer de tudo para tê-la. Ele é completamente apaixonado por ela.
Sei que Eva me ama, não duvido disso. Mas nossa situação não está ajudando. Ainda há a mágoa da nossa separação. As feridas estão abertas. Ela está vulnerável e isso torna tudo ainda pior. Não posso ignorar o fato de que, caso ela veja nossa relação como algo prejudicial e sem futuro, Brett seja um forte candidato a ocupar o meu lugar, mesmo que não seja algo imediato. Há muitas coisas e pessoas entre nós. Há muitos traumas, tristezas, incertezas. Tudo parece cooperar contra nossa união.
Não consigo pensar em mais nada pelo resto da manhã. Cancelo a reunião que seria realizada antes do almoço. Estou angustiado demais e isso só vai ter fim se eu ouvir a voz de Eva. Preciso ter certeza de que está tudo bem ou se o telefonema de Brett mudou alguma coisa. Tranco-me no escritório, tentando ler alguns relatórios e balanços para ver se as horas passam rápido, mas a ansiedade está me enlouquecendo. Cada segundo parece um minuto inteiro.
Ao 12h em ponto, o alarme vindo direto das caixas de som do meu monitor me desperta. Eva acaba de desligar o computador par ir almoçar. Avanço no telefone e disco seu ramal.
Ela atende ao primeiro toque, para meu completo alívio. “Escritório de Mark Garrity...”.
“Eva”, eu a interrompo, incapaz de esconder a emoção em minha voz.
Oi garotão”, responde suavemente.
“Me diz que está tudo bem entre nós”, vou direto ao ponto.
Está tudo bem?” ela parece preocupada. “Aconteceu alguma coisa?
 “Não”, só estou preocupado que você me troque por Brett Kline, penso. “Eu só queria ter certeza”.
Eu não deixei isso claro ontem à noite? Ou hoje de manhã?
Sim, deixou. Mas não posso confiar nisso. Afinal, a atração sexual entre nós é sempre intensa, e ela nunca escondeu seu deslumbramento pela minha aparência. Ter uma confirmação de seu amor no momento em que estamos juntos é muito diferente de ouvi-la dizer as palavras sem estar sendo influenciada pela minha sedução.
“Eu precisava ouvir isso em um momento em que você não estivesse olhando para mim”.
Desculpa”, sussurrou sem graça. “Eu sei que você reage mal quando as mulheres tratam você como objeto. Eu não devia fazer isso”.
Fiquei indignado com tamanha baboseira. “Eu nunca disse que não gostava que você se sentisse atraída por mim, Eva. Pelo amor de Deus. Fico feliz que você goste do meu corpo, porque eu gosto pra caralho do seu”.
Só a lembrança daquele monumento curvilíneo embaixo de mim, tremendo de prazer, é o suficiente para me deixar mais duro por ela. Mais que o normal.
 “Estou sentindo tanto a sua falta”, choramingou. “E, pra completar, todo mundo acha que a gente está separado, e que eu preciso partir pra outra...
“Não!” o grito carregado de desespero escapa da minha garganta antes que eu possa contê-lo. “Puta que pariu. Promete que vai me esperar Eva. Eu esperei por você a minha vida toda”, suplico.
Ela não pode fazer isso comigo. Não, não. Eu não suportaria se, por causa da situação em que estamos, ela cedesse à pressão de sua família e amigos para seguir em frente sem mim. Eu não teria vida, eu não teria nada.
 “Desde que você seja meu, posso esperar até o fim dos tempos”, fala baixinho.
 “Não vai demorar tanto assim. Estou fazendo o possível. Acredite em mim”, argumento ainda angustiado com a ideia de ela me esquecer.
Eu acredito”, diz firmemente.
Meu celular toca e, pela tela, vejo que é Arnoldo.  “Vejo você as oito em ponto”.
Certo”.
Encerro a ligação me sentindo mais determinado do que nunca e atendo Arnoldo.
Ciao amico, como você está?” saúdo.
Curioso, graças a você”, responde. “E feliz por sua voz não espelhar em nada a condição de miséria humana em que você se encontrava na última vez em que nos vimos. O que aconteceu?
A última conversa entre Arnoldo e eu não foi das melhores. Ele ficou preocupado e, como eu estava completamente imerso no assassinato de Nathan, acabei negligenciando sua amizade. E isso o enfureceu de uma forma que eu nunca havia visto. Mas, mais do que isso, eu o chateei, e isso me incomodou. Ele é uma das poucas pessoas que realmente se importam comigo.
Me ajeito em meu assento antes de falar. “Esta noite eu terei um encontro”.
Ouço um barulho alto e estridente do outro lado da linha, como se algo tivesse se espatifado em mil pedaços no chão.
“Arnoldo?” pergunto preocupado. “Está tudo bem?”
Sto bene. Aspettate um momento (Estou bem. Espere um momento)”, responde com a voz grave.
Eu o conheço. Deve estar cozinhando. Poucas coisas tiram Arnoldo de seu estado de espírito alegre e brincalhão, e desordem é uma delas. Ele odeia que quebrem coisas ou estraguem utensílios na cozinha. Meu amigo leva bem a sério sua profissão e já demitiu pessoas por falta de cuidado dentro de seu “santuário”.
Mais alguns barulhos e em seguida, ele volta à linha e respira fundo.
 “Eu acabei de quebrar uma vasilha muito cara porque de te ouvi dizer que vai ter um encontro?” ele respira fundo tentando conter sua fúria.
“É o que parece”, respondo com humor.
Está debochando de mim?” pergunta incrédulo.
“Claro, eu ia mesmo perder meu precioso tempo para tirar uma com a sua cara de propósito”, ironizo. “O palhaço dessa amizade é você”.
Explica logo essa porra direito antes que eu desconte a ira da minha vasilha quebrada em você”, ameaça entre dentes.
Reviro os olhos pelo seu escândalo de mulherzinha traída.
“Eu vou ter um encontro com Eva. Estou me reaproximando dela. É isso”.
Ele fica calado por um momento. “Vocês estão voltando?
“Esse é o plano. Quero reconquistá-la”.
Uau. Nunca pensei que viveria o suficiente para ouvir isso de você”, comenta. “Eu imaginei que essa separação não iria durar muito. É nítido o amor entre vocês. Dá pra sentir no ar”.
“Não tem mais volta, meu amigo”, me levanto e vou até a janela que me proporciona a mais bela visão de Manhattan. “Estou nessa para valer”.
Isso é meio óbvio. E o que é que você ainda não está me contando?
“Preciso de um favor”.
Ele engasga. “Como è (Como é)? Gideon Cross pedindo ajuda para um encontro? Estamos mesmo no fim dos tempos”, solta uma risada debochada.
Fico incomodado com seu comentário. “Estou falando sério”.
Estraga prazeres” suspira dramaticamenteDimmi quello che vuoi (me diga o que você quer)”.
“Você pode fazer um jantar para dois? Não precisa ser nada elaborado, porque vai ser em casa. Algo rápido, que dê para esquentar na hora”.
Ah, claro”, ele ri. “Porque o caminho para conquistar o coração da bellissima Eva começa pelo estômago. Ainda estou impressionado com o apetite dela”.
Sorrio de volta. “Sim. Meu anjo sabe apreciar uma boa comida. Ei, pode ser aquela lasanha que você fez para mim no meu último aniversário? Eu realmente gostei dela”.
Passei dias sentindo o gosto daquela lasanha na minha boca.
Então você quer que eu prepare uma lasanha para vocês dois?” sua voz denota seu indisfarçável e inabalável sorriso.
“Sim”. Eu ainda não sei bem como fazer um encontro romântico, mas vou dar o meu melhor.
Estou bem impressionado com seu esforço”.
“Eu não desistirei dela, Arnoldo. Nunca. Eva e eu somos para sempre”, murmuro baixinho. Sempre me sinto vulnerável ao falar dos meus sentimentos tão abertamente e isso me deixa desconfortável.
Meu melhor amigo se cala novamente. Dessa vez, por tanto tempo, que acho que a ligação deve ter caído.
“Arnoldo?” chamo.
Ele pigarreia antes de falar. “Para sua sorte, eu estou fazendo essa lasanha nesse instante. Eu iria colocá-la no forno, mas vou congelá-la para você”.
Grazie, amico (Obrigado, amigo)”, agradeço aliviado como por ele não ter comentado nada sobre o meu momento de fragilidade.
Stai zitto, stronzo (cale a boca, seu bobão)”, reclama. “Farei isso por que o melhor é você se manter longe da cozinha. Seu objetivo é reconquistá-la e não matá-la por intoxicação alimentar”.
 “Como você é dramático”, reviro os olhos novamente.
Io sono drammatico (eu sou dramático)? Eu ensinei você a fazer uma omelete e o que você fez? Um veneno comestível capaz de matar uma pessoa só pelo cheiro! Imagina se alguém tivesse comido aquilo?
 Acabo rindo com ele ao me lembrar desse dia. Quando Arnoldo veio morar definitivamente em Nova York, nós dividimos um apartamento por seis meses. Nesse meio tempo, ele tentou me ensinar a cozinhar, mas não deu muito certo. Eu sou um verdadeiro caso perdido.
Caminho do volta para minha mesa e, olhando o relógio na tela do computador, percebo que o horário de almoço está quase no fim e não comi nada ainda. Não que estivesse com fome, já que a ansiedade de mais cedo tirou todo o meu apetite. Mas foi só falar dessa lasanha, que meu estômago começou a protestar.
“Tudo bem, Arnoldo. Você tem razão, eu sou um desastre culinário, admito. Agora, a que horas posso ir pegar a lasanha? E aonde?”
Oh, ele admitiu que é ruim em alguma coisa! Realmente, o fim do mundo está próximo”, zomba.
“Rá, rá, rá! Como você é engraçado”, comento secamente. Admitir fraquezas não é o meu forte. “Agora é sério, tenho uma reunião daqui a pouco”.
Certo. Passe em minha casa assim que sair do trabalho e ela estará aqui prontinha esperando por você”.
“Ok! A gente se vê. Até mais!”
Arrivederci (até logo)”.
Desligo e, ao colocar o celular na mesa, vejo que o interfone está piscando. Scott tentou me contatar. Chamo-o de volta.
“Sim, Scott?”
Senhor Cross, eu tomei a liberdade de pedir o seu almoço. Ele chegou à meia hora”.
Balanço a cabeça satisfeito por meu secretário ter se adiantado. Não esperaria nada diferente. “Pode trazer”.
Sim senhor”.
Segundos depois ele entra.
“O senhor tem 1 hora e 25 minutos até seu próximo compromisso”, avisa enquanto põe o almoço sobre a bancada do bar.
“Certo. Da Vidal Records, irei direto para casa. Não volto mais ao escritório. Já sabe o que fazer”.
“Claro, senhor. Precisa de mais alguma coisa?”
“Não, pode ir”.
 Devoro a comida em vinte minutos e me preparo para a reunião com o pessoal da gravadora. Hoje vou reencontrar Brett pela primeira vez após o ocorrido no show. Tecnicamente, já que será por videoconferência. Obviamente, ele não vai deixar barato e vai me provocar em relação à Eva. Mas, se o patife está pensando que não haverá troco, é porque ele realmente não me conhece.
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Raul estaciona em minha vaga no estacionamento da Vidal Records. Guardo meu celular no bolso interno do paletó e resolvo não levar minha pasta. Sem esperar o motorista, eu mesmo abro a porta, e me encaminho para a entrada principal. A recepcionista fica surpresa por me ver, mas mantém seu profissionalismo e me cumprimenta polidamente. Respondo com um aceno de cabeça.
Christopher, meu padrasto, está em frente a um elevador aberto, provavelmente esperando por mim.
“Oi Gideon”, estende a mão.
Não guardo mágoa dele. Pelo contrário, eu o respeito e o admiro. Ele fez de tudo para que eu me sentisse confortável quando se casou com Elizabeth. E tentou me integrar à família quando meus irmãos nasceram. Nunca o vi como uma figura paterna. E isso se intensificou quando revelei sobre o abuso que sofri e ele não acreditou. Mas não poderia culpá-lo. Nem minha própria mãe acreditou, porque com ele, que não é nada meu, seria diferente?
“Christopher, como vai?” retribuo o cumprimento.
“Bem. E empolgado com o que vem por aí. Essa banda foi um enorme acerto para nós”.
“Eu imagino”, mantenho minha expressão impassível.
Entramos no elevador. Ele tira a chave mestra do painel e aperta o botão do 4º andar. As portas se fecham e o elevador segue o caminho programado.
“E você?” pergunta tentando parecer casual. “Como está?”
“Bem”, me limito a responder.
“Ireland está muito empolgada com sua aproximação. Não parou de falar do passeio que vocês fizeram no domingo”, comenta.
O rosto angelical e delicado de minha meia-irmã caçula me vem a cabeça e um meio sorriso surge em meus lábios. Nós nos aproximamos muito, principalmente durante a minha separação de Eva. Ireland é um poço de carinho, afeto e, por incrível que pareça, de maturidade. Eu tenho muito orgulho dela.
“Ela é uma menina doce e inocente, Christopher. Não merecia minha negligência. Gosto muito dela e farei questão de mantê-la em minha vida”.
Sua expressão é impagável. Seus olhos parecem dois pratos e sua boca se abre.
O apito do elevador indica que chegamos ao andar. Meu padrasto volta a si e pigarreia, sem graça por sua reação. Fico calado e mantenho meus olhos fixos nas portas que acabam de se abrir.
Saímos da cabine num silêncio constrangedor e nos encaminhamos para sala de reuniões.
“Ahn, isso é muito bom. Ireland está bem feliz”, ele volta a falar. “Sabe, ela vivia fazendo perguntas sobre você. Tinha curiosidade em te conhecer de verdade. Acho que esse era o maior sonho dela”.
Ouvir isso aquece o meu coração.
“Eu só queria pedir uma coisa”, ele para de caminhar e se vira para mim.
“Diga”, eu paro também e aguardo.
“Sei que você é um homem bom, Gideon. Nunca duvidei da sua índole. Prova disso foi que você comprou a Vidal Records e a manteve na família. Sei que fez isso porque sua mãe havia perdido tudo e não queria que ela sofresse ainda mais”.
Continuo a encará-lo sem esboçar nenhuma reação.
“Bem, a questão é que espero mesmo que você queira Ireland na sua vida e não a magoe. Não a deixe. Ela sempre quis isso. E, mais que isso, não a use para atingir sua mãe ou seu irmão. Ela não sabe de nada do que aconteceu e prefiro que permaneça dessa forma”.
Mas... o que... Quem ele pensa que eu sou?
“Acredite em mim, eu sou o mais interessado em manter essa merda toda debaixo do tapete, principalmente quando se trata de Ireland”, digo asperamente. “Eu nunca envolveria nisso ou a usaria dessa forma. Ela é uma garota ótima. Nossa aproximação aconteceu principalmente por causa de Eva e foi uma coisa boa para mim. Sei que se preocupa com sua filha, mas não há necessidade de termos esse tipo de conversa”.
Ele suspira. “Claro, me desculpe, eu só estava sendo pai. Se um dia você tiver um filho, vai me entender”.
“Eu já entendo. Mas recomendo que, ao invés de você se preocupar com minha relação com Ireland, você preste mais atenção na índole do seu outro filho, que não é das melhores”, encerro o assunto e caminho para a sala de reuniões.
Christopher apenas me segue sem dizer uma única palavra.
Ele realmente não me conhece. Pelo amor de Deus, eu jamais usaria Ireland para o que quer que seja! Será que eles não entendem que eu não quero envolvimento algum com minha mãe ou com meu irmão? Não tenho a menor intenção de me aproximar, seja para me reconciliar ou para me vingar deles.
Empurro esse pensamento para o fundo da minha mente e me concentro no que enfrentarei a seguir. Ao chegar perto da porta, escuto barulhos de risadas, e de pessoas falando alto. Coloco minha máscara mais fria no rosto e giro a maçaneta.
Assim que entro na sala de reuniões, as vozes animadas cessam e o clima no cômodo fica tenso de repente. Todos se levantam em saudação, mas meus olhos só enxergam uma pessoa, no telão montado para a videoconferência. Assim que entro no foco da câmera, vejo suas feições mudarem e seu olhar brilhar de determinação. Um discreto sorriso arrogante surge em seus lábios. Ele está exalando confiança. Sem a menor intenção de engolir sua provocação, lhe lanço um olhar igualmente determinado, que ele capta no mesmo instante. O sorriso some e seu rosto endurece em resposta. Num silêncio mais do que significativo, a guerra entre mim e Brett Kline acaba de ser oficialmente declarada.
Olho atentamente os demais integrantes da banda ao lado dele junto com o empresário, que me encaram com receio e respeito. Na sala de reuniões, estão presentes Dora Kaufman, assessora de imprensa da gravadora, Billy Hans, da equipe de marketing e Martin Brown, da logística.
“Boa tarde a todos”, eu me posiciono na cabeceira da mesa.
“Boa tarde, senhor Cross”, respondem em uníssono.
“Bem, vamos começar. O que temos planejado até o momento?” pergunto enquanto me sento.
Todos seguem meu exemplo, inclusive Christopher, que se senta ao meu lado.
Durante a reunião, ajeitamos todos os detalhes do lançamento do clipe. Conforme já acordado, ele será exibido em um telão na Times Square. Será montado um palco onde a banda ficará para recepcionar o público. Eles não vão tocar, porque não poderemos manter o tráfico parado por mais de três horas. Haverá toda uma estrutura para preservar os equipamentos bem como para a equipe envolvida. A imprensa ficará no canto esquerdo do palco e só poderá fazer entrevistas após a exibição do clipe. O esquema de segurança já estava armado. Foi acertado que o evento irá acontecer na quinta à noite.
A banda fica em silêncio apenas assentindo. Só o empresário deles fala.
“Mais alguma questão a ser resolvida?” pergunto.
Na verdade, sim”, a voz inconfundível de Brett soa em meus ouvidos e volto a encarar o telão.
Sim?” o clima fecha no mesmo instante. Todos nos encaram apreensivos, afinal ele sabem do que aconteceu entre nós no último show deles em Nova York.
Eu convidei a musa inspiradora da música para o evento”, diz sorridente. “Acho que vai causar mais impacto. Além disso, ela merece estar presente. E vai chegar ao evento comigo”, ele frisa olhando bem para mim.
“Eu não acho que seja...”, Christopher começa a falar, mas corto secamente.
“Não vejo problema nisso. Desde que esteja tudo de acordo com o foi determinado aqui”, lhe lanço um olhar gélido. “Se não temos mais nada a resolver, tenho outro compromisso agora. Senhores”, me levanto e todos me seguem.
Encerro a reunião e saio da sala sem olhar para trás.
O desgraçado não perdeu a chance de me provocar. Claro que ele irá abraçá-la, tocá-la em todas as oportunidades e fará questão de esfregar isso na minha cara.
Merda, merda, merda!
Sem me alterar, mas com a cabeça fervilhando, vou em direção ao carro. Raul abre a porta traseira para mim.
“Para a casa de Arnoldo Ricci”, ordeno.
“Sim senhor”, ele fecha a porta assim que entro e dá a volta para retornar à direção.
Recosto a cabeça no apoio do banco e fecho os olhos, tentando controlar a fúria assassina que ameaça se manifestar novamente. Tendo me lembrar dos momentos maravilhosos que Eva e eu passamos juntos, como nossa viagem para a Carolina do Norte e isso me acalma um pouco.
Em seguida, me recrimino. Brett é sim um desafiante à altura, mas não é invencível. E se tem algo com o que eu sei lidar e muito bem é com desafios. Nunca desisti de nada em minha vida. E, agora que finalmente encontrei algo que faz minha existência ter um sentido verdadeiro, não vou deixar escapar. Não. Eva nasceu para mim. Ela é minha, e ninguém vai tirá-la de mim. Não enquanto eu viver.
Raul para em frente ao prédio de Arnoldo. Saio do carro, me encaminho para a portaria. Como sou uma visita já conhecida, o porteiro apenas me cumprimenta e me deixa passar. Minutos depois, estou tocando a campainha.
A porta se abre revelando a figura robusta do meu sorridente amigo.
Ciao, stronzo!”
Ciao, amico”, retribuo numa animação mais controlada.
Cumprimentamos-nos com nosso habitual abraço que inclui tapas nas costas e entramos.
“Nem acredito que vai ter seu primeiro encontro de verdade”, diz fechando a porta. “Estou me sentindo como uma mãe orgulhosa. Devo tirar uma foto?” e bate os cílios de forma afeminada.
“Deixa de ser ridículo” falo entre risadas. “Cadê a famigerada lasanha?”
“Na geladeira. Andiamo (Vamos)”.
Entramos na elegante cozinha, que inspirou o cenário do programa de culinária que ele apresenta. Tudo organizado, limpo e em seu devido lugar.
Ele abre o refrigerador e retira duas travessas devidamente lacradas.
“E aqui está. Uma lasanha à bolonhesa no capricho para meu amigo, apenas esperando para ir ao forno. Também fiz uma salada para viagem”, diz fechando a porta da geladeira e me entregando o saboroso jantar.
“Mal posso esperar para provar. Sei que Eva vai adorar”, pego a travessa com as duas mãos.
“Você me parece calmo demais para quem vai ter um encontro”, me analisa. “Vocês já tinham conversado antes, não é?”
“Sim. Apenas combinamos de ir mais devagar, desta vez”, minto.
“Sei”, ele não parece acreditar muito no que eu disse, mas ignora. “Bene (bem), espero que tenham um ótimo jantar e que dê tudo certo”.
“É pelo que venho torcendo desde que a conheci”, digo olhando para as duas travessas em minhas mãos.
“Você sabe que pode contar comigo, não sabe?”, ele apoia sua mão em meu ombro e o encaro. “Para tudo, a qualquer hora, em qualquer lugar. Você é como um irmão para mim e o que mais quero é sua felicidade. E se ela está em Eva, nada nem ninguém tem o poder de te impedir. Não se você estiver realmente disposto a lutar por isso”.
Ele está claramente falando de Brett. Mesmo sem saber, meu amigo acaba de me dizer tudo o que preciso ouvir.
“Sei que você não gosta quando te agradeço pelas coisas”, digo. “Mas não posso deixar de me sentir agradecido por ter um amigo tão fiel como você. E quero que saiba que a recíproca é verdadeira. Conte comigo para tudo, a qualquer hora, em qualquer lugar”.
Sorrimos cúmplices, mas ele logo muda de assunto e me enxota para fora de sua cozinha.
“Chega dessa melação! Parecemos duas mocinhas”.
Dou risada. “Você que é sensível demais”.
“Vai lá se arrumar pro seu encontro. E me dê notícias”, ele abre a porta para mim.
“Pode deixar”.
Nos despedimos e sigo para os elevadores.
Passo em meu apartamento na Quinta Avenida para trocar o terno por uma roupa mais esportiva, sem esquecer o boné. Dispenso Raul de dirigir e o incubo da tarefa de providenciar um carro para o “vizinho do lado”.
Dirijo a Mercedes até o prédio de Eva pensando nas palavras de Arnoldo. Ele tem razão. A felicidade é uma conquista. E só me tirariam ela se eu não lutasse. As palavras dele renovaram meu ânimo. É impressionante o quão bem ele me conhece, mas eu já não deveria ficar tão surpreso. Não é a primeira vez que ele demonstra que consegue me ler melhor do que qualquer outra pessoa, exceto Eva.
Chego ao apartamento, ponho a lasanha na geladeira e vou direto para o chuveiro. Tomo um banho demorado e lavo os cabelos.
Já seco e com a toalha enrolada em meus quadris, vou ao closet escolher uma roupa. Dou uma olhada nas peças e me deparo com o suéter que usei na noite em que cerquei Eva em um de meus clubes. Um sorriso surge em meus lábios ao me lembrar daquele dia. Foi ali que decidimos que estaríamos na vida um do outro, ainda que não tivéssemos a intenção de oficializar nada. Mesmo que as coisas sejam diferentes agora, o nosso começo se deu ali. E ela manifestou o quanto ela tinha gostado do meu visual despojado. Com isso em mente, resolvo usar a mesma roupa daquela noite.
Já vestido, vou até a adega e escolho um Cuvée Les Garrus, considerado o vinho rosé mais caro do mundo. Esse foi um presente dado pelo próprio dono do vinhedo onde é produzido, após fecharmos negócio. Eu esperava um momento realmente significativo para abri-lo, e ele finalmente chegou.
Com tudo pronto, sigo para a sala, pego meu celular e aproveito para dar uma olhada em meus emails. Recebo uma mensagem de Raul avisando que a compra do carro foi efetuada e que ele chegará amanhã. A notícia me deixa mais tranquilo, pois tenho andado muito com a Mercedes ultimamente, tanto para vir para cá quanto para ir ao trabalho. Para não ter surpresas, decidi que o mais seguro é que o novo vizinho tenha seu próprio carro.
Quando dou por mim, já são oito horas. Deixo o telefone de qualquer jeito sobre o criado mudo ao lado do sofá e, no segundo seguinte, a campainha toca. Meu coração dispara e começo a ficar nervoso. Quero que essa noite seja perfeita. Tem que ser. Respiro fundo e abro a porta...
Puta. Merda.
Eva está tão sexy e desejável. Suas curvas suntuosas preenchem cada centímetro quadrado do vestido preto curto os saltos alongaram suas pernas. E, ao que parece, ela se sente tão nostálgica quanto eu. Suas orelhas estão adornadas com as mesmas argolas de diamantes que ela usou em nossa primeira aparição pública, no jantar beneficente. Seus cabelos curtos me permitem ter uma bela vista de seu colo e da curva do topo de seus seios. Sua maquiagem escura nas pálpebras ressalta o brilho de seus orbes acinzentados que me encaram com desejo e luxúria.
É. Assim vai ser difícil manter o romantismo.

Putz, que barra, hein? E esse Brett não vai sair do pé dele tão cedo. O martírio do nosso CEO favorito está só começando. Que linda amizade dele com o Arnoldo, né? Adoro esses dois! Para quem está acompanhando 'Toda Minha', não se preocupem! Postarei  ainda hoje, tá? Espero que tenham gostado desse. Comentem muito! O próximo capítulo não vai demorar, prometo!  
Beijos e até breve!

8 comentários:

Lwangia disse...

Parabéns! Adorei o capítulo, você é uma ótima escritora. Aguardando o próximo, ja na expectativa. Beijos!

Rafilza disse...

Maravilhoso!! Quero mais!!!!!! Rsrs

Unknown disse...

Perfeito. Quero mais

Unknown disse...

Maravilhoso quero o livro todo..Parabéns pela excelente escritora que vc é.

Unknown disse...

Como sempre perfeito! !! Parabéns linda... anciosa pelo proximo capítulo!

Unknown disse...

Perfeito!!!!! Adorei, super mega ansiosa para o próximo capítulo, já imagino como será a noite desse jantar incrível!! Meu Deus vou morrer esperando os dias, não demora muito pra postar não please!!!! Você arrasa gata!

Unknown disse...

Amei...ansiosa para o próximo bjs��

Unknown disse...

Muito bom !!!!! Quero mais Gideon .